flores de cimento

enamorou-se pela moça magrela
que nada tinha de peso
nada nela pesava de modo algum
pés no chão era um custo só

mas enamorou-se por ela
mesmo assim
mesmo sem saber se ela ficaria
com os pés e o coração no chão

queria um amor leve aquele moço
um amor que coubesse nos cantinhos
que coubesse no coração
um amor para andar nos balões

logo ele que tinha medo das levezas
e das coisas que ignoram a gravidade
pensou medo maior não há
do que minha moça partir ao alto dos céus

desenhou um ou dois modos então
de guardar seu amor bem no chão
onde as coisas todas são iguais
e se pode olhar nos olhos sem esforço

porém tudo o que fizera nos desenhos
parecera-lhe rude ou indelicado ou vulgar
e o amor embora guardado deve ser desamarrado ele sabia
sonhava em ser e ter um amor desprendido

pensou em caixas grandes e desistiu
pensou em cabanas grandes e desistiu
pensou em planetas menores e desistiu
pensou em amar menos e desistiu

só mais à noitinha se deu conta
de que os amores felizes não são de voar
e que o peso das coisas é quem escolhe
o que fica e o que parte para o longe dos olhos

fez então um punhado de flores de cimento
e deu para a moça magrela guardar
embora soubesse que o seu amor por ela
era de maior peso do que todas as coisas do mundo