diálogo V

minha senhora
perdoa-me muito
e orgulha-te de mim
que já larguei o fumo

isso tudo é pouco
é nada
um miúdo
perto de tudo que me causas

já nem durmo fora de casa
na calçada à fome
não há graça
mais nenhuma graça que a outra mulher eu faça

mas isso basta
e não te metas em casa
a baforadas dizer asneiras
não há nada que me convença cala

muito me acanho
se pareço-te estranho
dentro de casa
mudar-me por dentro já não mais lhe basta

já estás desastrado
tropeças nas calças
um porco imundo
por que não te calas

prometo-te tudo
nem mais um descuido
juro em pé junto
que sou outra alma

não jure ou prometa
tu és de veneta
estou bem cansada
das tuas migalhas

e queres que eu prove
do alto me jogue
da ponte ao rio da janela ao mato
daqui ao teu beiço

não meta-te a besta
nem ponha-te em miséria
as tuas promessas
passam-me longe aos ouvidos

então não há nada
se minhas palavras
falharam a emboscada
de meu amor por ti contar

nenhuma palavra
é feita de armas
mas fere como espada
num peito a atravessar

pois bem eu me mudo
emudeço e mudo
e levo-te tudo
de tudo o que me deste

leve consigo
o mudo da boca
a muda de roupa
o mundo e o peso

quero-te muito
mas sou muito estúpido
eu perco o teu tudo
mas levo-te um resto de beijo

saia diacho e suma daqui
que ainda me estraga o batom da cara
que ainda me estraga o coração do peito
que ainda me estraga a calma da alma