mulher

desabotoou as costelas
como se fosse possível
despir-se da pele
e ser só alma

lançou-se ao mundo
onde as pessoas cegas
enxergam às pressas
somente o que podem tocar

era uma moça-fantasma
a vagar pelas ruas
sem sangue carne veias ossos
e os destroços do coração

desprendida e pálida
sem as manchas dos batons
e as poeiras que maquiam
e os homens que magoam

solta e liberta
da finura das canelas
do dourado dos vestidos
e das cartas de adeus

o sol que ensopava os cabelos
já não lhe presta mais
e não empresta mais
nenhum calor nem luz

nua das coisas comuns
não se veste de ninguém
não espera por ninguém
que lhe possa fraturar

o corpo das mulheres é assim
genuíno e particular
desabotoado das roupagens
que não prestam ao delicado da alma

e são todas mulheres-fantasmas
que habitam os corações mais honestos
e os olhos mais queridos
capazes de as enxergar

desabotoou as costelas
visto que é possível
despir-se da pele