escombros

alguns descem aos escombros da vida em busca das coisas sobreviventes. enquanto os primeiros jamais deitam fora suas esperanças, os últimos se suportam e resistem. ambos não têm nenhuma certeza do êxito, mas nunca abdicam das forças. sabem que o êxito, aqui, faz nascer o encontro. resta-nos: encontre ou seja encontrado.

almas plantadas

plantaram as almas nos homens. por isso, criam raízes, parem frutos; e essas coisas de árvore. servem aos papéis e sombras. lareiras. seguram balanços para crianças felizes. ar. plantaram as almas nos homens. e o coração. por isso, vivem, morrem; e essas coisas de gente. servem aos sentimentos e sangue. falta. descompasso. silêncio. plantaram as …

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troco

restaram-me poucos centavos de um amor passado. por isso meu silêncio solene e perpétuo impera. tenho medo dos gastos desnecessários e abusivos dos amores baratos. outrossim, o amor que me cobrar muitas moedas será pobre, uma vez que a riqueza de amar exige mais do que preços; carece de valores.

visões

há visões em todos os olhos que veem há olhares em todos os olhos que apreciam há cegueira em todos os olhos que julgam há razão em todos os olhos que criticam há saudade em todos os olhos que se fecham há amor em todos os olhos que se abrem

desajeito

as ruas ensopadas não servem muito aos sentimentos dos pés encobertos pelo couro polido. às vezes é necessário um bocado de deselegância para sentir as coisas.

quadro

as pessoas pregam qualidades umas às outras como quadros em uma parede vazia. a arte do adjetivo – quadro – pode até sugerir parcial beleza que merece alguma observação. entretanto, cada parede – pessoa – sabe bem o quão profunda é para ser capaz de suportar as mágoas dos pregos.

presente ausência

espere anoitecer que há meias nas lareiras e pessoas inteiras esbanjadas nas salas as cordas luminosas que abraçam árvores carregadas iluminam ao seu tempo os presentes e as ausências com palavras emboladas e caixas enlaçadas as pessoas deixam escapulir verdades e saudades que demoraram dizer há sapatos melhores bonecas de pano perfumes e algumas palavras …

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o homem da rua (aos poetas)

os braços perpendiculares repousavam sobre os joelhos juntos enquanto os pés sempre desnudos lembravam dos caminhos já percorridos ao lado um chapéu arrasado onde uma antiga cabeça pensante dava lugar às moedas apoucadas de valor sem deixá-las escapar pelas feridas do tecido assistia a pressa da vida representada pelos sapatos um tanto ligeiros e os …

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o amor esquecido

as pessoas esqueceram no bolso das calças o bocadinho de amor que lhes restava. e deitaram-nas às máquinas para lavar. ali, enclausurado junto aos amontoados de roupa, permanecia represado o amor. afogava-se junto às imundícies das coisas usadas pelos homens. e pelas moças. e pelas crianças. a limpeza que se pretendia com aquele mar claustro …

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mudo

só há vantagem na solidão praticada quando não se é mudo da boca para dentro. assim, toda presença exógena pode ser compensada. assim, toda ausência endógena desespera.